Ouroboros: Heráclito, Parmênides e o Mito de Sísifo sob o Olhar de Nietzsche
Tudo flui, dizia Heráclito. Mas há fluxos que giram em círculos, como Sísifo empurrando sua pedra eternamente. A permanência, nesse caso, não é estagnação, mas repetição: um ciclo vicioso que também é forma de continuidade. O tempo não é linha reta — é espiral.
O universo nasceu do Big Bang, e alguns acreditam que terminará num Big Crunch. Seria essa a eternidade? Um ouroboros cósmico — a serpente que devora a própria cauda, girando sobre si mesma, sem começo nem fim. A física moderna flerta com mitos antigos, e a cosmologia se curva diante da poesia.
Vivemos entre o carbono e o silício, entre o orgânico e o sintético, entre o que morre e o que simula vida. Somos matéria que pensa, e pensamento que se materializa. E, mesmo assim, sempre voltamos ao mesmo ponto: à busca de sentido, à repetição dos mitos, à reinvenção do eterno retorno.
Se Heráclito via o mundo como um rio em constante mudança, Parmênides naufragava num oceano de incertezas. Daria todo o tesouro do mundo por uma tábua de salvação — uma certeza sólida, imóvel, onde a Verdade se revelasse como um continente firme em meio às águas revoltas do devir. Para ele, o ser é, e o não-ser não é. Nada muda. Tudo permanece. O mundo sensível é ilusão; só o pensamento revela o real.
Mas então vem Nietzsche, como um raio que rasga o céu da metafísica. Ele não escolhe entre Heráclito e Parmênides — ele os funde. O eterno retorno é mudança que retorna, fluxo que se repete, ser que se reinventa. É a dança do tempo sobre o abismo, onde cada instante deve ser vivido como se fosse eterno.
Sísifo, sob o olhar de Nietzsche, não é mais um condenado — é um criador. Se tudo retorna, cada gesto é sagrado. A pedra não é punição, é possibilidade. O absurdo se transmuta em afirmação. A vida não precisa de sentido externo: ela é o próprio sentido, quando afirmada com coragem.
E assim, entre o fluxo e o ser, entre o mito e a física, entre o absurdo e a criação, seguimos. Somos serpentes que devoram a própria cauda, pedras que rolam montanha acima, rios que jamais são os mesmos — e, ainda assim, somos.

















