segunda-feira, 15 de julho de 2024

 

Efeito Casimir





Depois de um longo tempo de convalescença - abri a janela, deixei as ondas de fótons inundarem meu espaço físico restrito. Consegui emergir da virtualidade dos meus pensamentos. Agora era matéria visível. O corpo combalido pela alcoolemia reanima-se, o conjunto de átomos que formavam os membros obedeciam a corrente elétrica vindo do centro ejaculador de ordens biológicas. O olhar de varredura se deparou com copos & livros de nietzsche espalhados pelas trincheiras do quarto revivido. Botelhas de vários gêneros tombadas adquiriam vitalidade aparente. Precisava colocar o exercito desordenado em condições. 





Nada melhor que um copo de whisky para saudar a primavera, não a do calendário, medida pela movimento de translação do planeta, mas sim um estado orgânico que reflete no pensamento. As falanges enferrujadas estão aptas para concluir trabalhos escriturais que vem com o fluxo da consciência. A bebida alcoólica penetra pelo sistema gástrico & logo atinge o córtex. A poesia está escrita com tinta invisível por toda a natureza pura - que não sofreu intervenção do homem.   Coloco as quatros estações de Antonio Vivaldi, facilitada pelo Youtube. Ouço sinais de vidas entrarem pela janela, mas não posso ter mais contatos com este universo artificial. Os pensamentos se aprofundaram muito no período de pré-morte. A incompreensão permeia toda a existência, sou um gerador de confusões e mal-entendidos. Estou sempre em fuga alucinada  pelos escaninhos do que  Heidegger chama de Ser-Aí-No-Mundo (Dasein). O álcool me põe em movimento, só minhas sub-partículas mais intimas sabem do que estou falando...






Não sei contar quantas vezes ouvi:

- Escolha... O álcool ou a vida....

Nesta circularidade de abstemia & vida etílica vou construindo a minha obra. Primaveras e outonos se alternam. Cordeiros & lobos. 
Tropeços, quedas, sangue em todas regiões do corpo. Erguimento, caminhar, respirar fundo e navegar no mundo irreal dos meus pensamentos. As minhas palavras tem uma profundidade semântica que escapa da capacidade de entendimento humano. Não consigo achar sentido na existência. Os felinos são as únicas visitas. São elegantes e preenchem as lacunas do pensar e escrever. Uma animação tímida começa a percorrer o sangue gélido. Em breve um carregamento de álcool se fará presente. Há esperança... 




A última cartada está em stand by. A longa praia no extremo sul da America em breve será o refugio. O corpo desafiará o ambiente inóspito. Os pensamentos disputarão com o vento polar a sobrevivência. Frio extremo, deserto humano, vasta imensidão de oceano que os olhos são insuficientes para ver. A vida difícil, sofrida no ermo será a última solução. A natureza pura e sua cruel pureza terá que me dar élan, impulso, arrebatamento de viver.   Well, por enquanto, vou esperar o carregamento da esperança. Na noite estarei brindando secretamente com os que foram. Minha melhor amiga se foi hoje. A notícia chegou inesperadamente. A estupidez do transito, do homem, a irracionalidade violenta e infinita que habita o corpo de cada ser deste planeta... Limpem as taças, espoquem as rolhas, encham os copos - preciso transcender...



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