Gosto das especiarias. Elas carregam em si não apenas aromas e sabores exóticos, mas também histórias de ambição, desejo e travessias. Foram elas que impulsionaram as grandes navegações, movendo portugueses e espanhóis em direção às Índias Orientais, em busca de riquezas, luxúrias e temperos que, ironicamente, moldariam o Ocidente mais profundamente do que a própria cultura judaico-cristã.
Essas rotas marítimas não eram apenas caminhos comerciais — eram veios por onde circulavam ideias, crenças, filosofias e contradições. Afinal, o pensamento filosófico, tão reverenciado no Ocidente, tem raízes que brotam a Leste de Greenwich. Foi lá, nas margens do Ganges, nos desertos persas, nas montanhas chinesas, que surgiram os fundamentos da sabedoria, antes de serem reinterpretados, muitas vezes distorcidos, pela lógica ocidental.
“Navegar é preciso”, já dizia o poeta, mas hoje, mais do que nunca, é preciso questionar para onde estamos navegando. O naufrágio, neste contexto, não é acidente — é consequência. É o resultado direto das atitudes predatórias do capitalismo, da exploração incessante do homem pelo homem, da mercantilização da vida e da natureza.
As especiarias continuam a perfumar o mundo, mas o aroma que se espalha agora é misturado ao cheiro de mares revoltos, de histórias esquecidas e de civilizações que foram silenciadas em nome do progresso. Talvez seja hora de redescobrir essas rotas — não para conquistar, mas para compreender.

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