MONOLOGO DIANTE DO GELO
(Silêncio. O som distante da água se quebrando contra o gelo. Uma figura observa o iceberg, imóvel.)
Você já viu algo tão imenso e tão frágil ao mesmo tempo?
Esse colosso branco, essa escultura do tempo... parece eterno. Mas está derretendo. Lentamente, sem alarde. Como tudo que finge durar.
O gelo não grita. Ele se desfaz em silêncio. E talvez seja isso que mais assusta — a ideia de que até o que é monumental pode desaparecer sem fazer barulho.
(Ele se aproxima um passo.)
E eu aqui, pequeno, transitório, tentando entender o que significa “mudar o mundo”. Como se o mundo fosse uma coisa que se deixa mudar. Como se ele não fosse feito de forças que nos ignoram — o vento, o tempo, o gelo.
Talvez seja ingênuo. Talvez seja arrogância. Ou talvez seja só desespero disfarçado de esperança.
Porque no fundo, o que eu queria mesmo... era deixar uma marca. Uma fissura. Um traço mínimo que dissesse: “eu estive aqui”. Mas o mundo não guarda rastros. Ele engole tudo. Até os icebergs.
(Pausa. O personagem se ajoelha, toca a água.)
E se mudar o mundo não for sobre transformá-lo, mas sobre ser transformado por ele? Ser tocado, abalado, derretido. Como esse gelo. Como essa ideia.
Talvez seja isso. Talvez mudar o mundo seja aceitar que ele nos muda — e que, às vezes, isso basta.
(Silêncio. O som do gelo se partindo ao longe.)
Porque há beleza naquilo que se desfaz. Há verdade naquilo que não resiste. E talvez seja nesse instante, nesse breve contato entre o que somos e o que não podemos controlar, que algo muda. Não lá fora. Aqui dentro.
(Ele se levanta. Olha para o horizonte.)
Eu não vim para vencer o mundo. Vim para escutá-lo. Para senti-lo. Para ser parte dele, mesmo que por um instante.
E se esse instante for tudo o que há... então que ele seja inteiro.
The End


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